Sentaram-se na varanda, num mesmo banco, e observaram a paisagem: várias casas parecidas, construções antigas, mas muito boas. Postes de energia, lâmpadas de mercúrio semiacesas. Várias árvores floríferas, pássaros pousados em seus galhos. Em alguns jardins havia cachorros - alguns latiam, por causa dos rojões de final de campeonato de futebol. O céu era de um azul bebê muito nítido, apenas com umas poucas nuvens, as quais quase se podia tocar, de tão próximas que pareciam. E deviam ser feitas de algodão, por seu tom branco impecável - era impossível que fossem constituídas de qualquer chuva ou temporal, pois traziam uma paz que não combinava em nada com raios e trovões. "Você me traiu", disse ela em tom melancólico, quase chorando de dor.
"Perdoa-me, não pude controlar. Aliás, você sabe... Várias coisas simplesmente acontecem, sem que saibamos o porquê e sem que as percebamos acontecerem...", respondia ele, resignadamente, antes de ser interrompido aos gritos.
"Não me venha com essa de que não se deu conta do que estava fazendo! Acha que sou tola? Você poderia, perfeitamente, ter me afastado de tanto sofrimento, de tanta dor e tantas lágrimas! Se eu pudesse me livraria de você", havia um tom desesperado em sua voz, ela quase não conseguia conter as lágrimas que rolavam de seus olhos, passando pelas maçãs de seu rosto, até chegarem os lábios trêmulos.
"Não fale assim... Você precisa de mim, eu preciso de você!", respondia ele, começando a perceber toda a dor e todo o vazio que a habitavam, como parasitas. "Mas, se te faz melhor, vou embora. Posso voltar quando toda essa maré houver passado."
"Era o que eu deveria querer. Mas não consigo suportar te sentir longe", as lágrimas começavam a cessar, o pranto já não era tão doído. Mas ainda assim, se podia ver nos olhos dela toda a angústia que carregava.
Um silêncio duradouro se fez presente. Tinha tanta força que ambos quase não o suportavam, parecia mais massacrante do que qualquer outro silêncio.
Ela pôs a cabeça entre as mãos, como numa tentativa de conter os pensamentos turbulentos que ali passavam. Ele olhou para ela, como quem entendesse o que estava acontecendo, beijou-a na testa e levantou-se.
"Aonde vai?", perguntou ela, desesperada com a possibilidade de perder aquele companheiro, o que conhecia desde que tinha algum entendimento da vida.
"Vou trazer um amigo. Alguém que pode te ajudar. Confie em mim, como nunca fez antes."
Ela assentiu com a cabeça e o observou partindo.
Três anos se passaram.
A campainha tocou. Um susto. Era ele. E agora?
Ela ajeitou os cabelos e a roupa com as mãos, desceu as escadas correndo e abriu o portão.
Ele parecia tão mais maduro do que antes! Como estava bonito! E como sempre, cumprindo suas promessas. Voltou com o tal amigo ao lado. Alguém alto, forte, e com uma expressão de bondade infinita, como se pudesse suportar qualquer golpe - e podia.
Ele começou a se desculpar pela demora, ela sorria absolutamente feliz por vê-lo de novo.
"Ainda se lembra de mim?", disse ele. "Sou o Amor. E aqui está meu amigo Perdão, o qual eu prometi trazer para que lhe ajudasse. Mas ele acaba de me contar que te conheceu a pouco tempo, e que eu poderia finalmente voltar, para que fossemos felizes juntos."
Passei por mudanças.