Sobre flores e amores
quarta-feira, 6 de maio de 2009
  Mário Antônio de Almeida e Silva
Querido irmão Zeca,

Não tive tempo de responder suas últimas cartas, porque tenho trabalhado muito.
Vir para a cidade grande foi uma boa escolha! Tenho ganhado bastante dinheiro, conhecido mulheres muito interessantes e participado intensamente da vida cultural dessa terra.
Ah!, Zeca, você e a mãe precisam ver como aqui é bonito! Logo que juntar dinheiro, mando passagens para vocês virem me visitar. Estou num quarto alugado em uma pensão, mas logo vou poder comprar minha casinha.
Irmão, estou apaixonado. Vem surgindo nos últimos tempos a moça da voz mais bonita que eu jamais ouvi. Chama-se Elis, canta como um anjo! Dizem que possui gênio forte, é chamada de Pimentinha. Algo em seus olhos fez com que eu caísse de amores por ela. Faz espetáculos frequentemente no eixo Rio-São Paulo, e agora foi convidada para participar de um programa de televisão chamado Noites de Gala. Olhe essa foto dela que saiu no jornal local, e mostre para a mãe também.
Falando em televisão, acredite, Zeca, por aqui chegou uma novidade: transmissão a cores! Vocês tem que ver a maravilha que é. É claro que não comprei, pois são muito caras, mas andei olhando em algumas lojas.
Sabe, Zeca, sinto saudade do campo, de acordar com o galo cantando e daquele verde bonito pela janela do quarto. Se não precisássemos tanto do dinheiro, voltaria correndo para perto de vocês. Depois que o pai se foi, minha vida mudou muito.
Ah!, mano, como é ruim ficar sozinho durante a noite, lembrando dos tempos em que ajudávamos nossos pais na plantação e com o leite fresco. Sinto muita falta daquele gosto forte do leite tirado na hora. Aqui é tudo diferente, perto do que tomávamos por aí, o leite da cidade parece água.
Por aqui também não tem os pássaros que cantam alegres por aí. Só se ouve o barulho dos carros, ou, quando estou na fábrica, o som das máquinas funcionando.
O ar daqui também é um pouco mais pesado, provavelmente por causa da fumaça que toda essa evolução tecnológica traz. Sinto falta do cheiro de mato fresco.
Por esses dias, passei em frente a uma padaria, e o cheiro do pão saindo do forno, me lembrou as tardes em que a mãe batia a massa, para que o pai tivesse um café da manhã fresquinho no outro dia.
Sabe, Zeca, ainda me dói falar do pai, você não imagina como sinto saudade daquele velho implicante. Às vezes me pego lembrando dos finais de tarde aos domingos, quando ele sentava naquela cadeira de balanço velha, acendia o cigarrinho de palha e botava o rádio no último volume para ouvir aquela música caipira que até doía dentro da gente. Essa imagem me conforta nos momentos de maior solidão.
Mande um beijo para a mãe, e leia essa carta para ela. Diga que estou muito bem, apesar da falta do campo na minha vida.
Mano, estou mandando um quantia pequena em dinheiro, para ajudar em algumas despesas. Se precisarem de alguma coisa, me avise! Posso não responder às cartas imediatamente, mas leio todas elas, e farei o possível para ajudar.
Espero ter tranquilizado vocês sobre qualquer preocupação a meu respeito.

Um beijo em você e outro na mãe, morrendo de saudades,

Seu irmão,
Mário.

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Descobrindo, aos 28 anos, que ser mulher é muito mais do que sempre imaginei. Mãe do Mateus, que me ensina tanto todos os dias sobre como ser alguém melhor e que faz o melhor que pode.

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