quinta parteDepois do acontecido, Mariela não seria mais a mesma. A menina doce, de expressão infantil, agora tinha medo de qualquer barulho, seus olhos traduziam o medo que sentira no dia do assalto. Seus companheiros de trabalho e faculdade percebiam claramente a mudança em seu comportamento, mas quando perguntavam o que havia acontecido, ela desconversava, falar no assunto lhe fazia mal. - Que é que houve com você, menina? Cadê a coragem e a vontade de enfrentar a vida que você sempre demonstrou? – questionava Garcia. - Pare com isso, continuo a mesma de antes... Acho que só estou meio cansada dessa monotonia que é a minha vida. - Mas não era o que você queria para você? – perguntou Marcelo. - Acho que era... Mas tinha outra imagem da cidade, quando vim para cá. - Até seu tom de voz está desanimado, você não era assim até esses dias, mesmo! De umas duas semanas para cá foi que você ficou desse jeito meio cabisbaixo. - Ora, Marcelo, é só impressão sua... Estou só um pouco cansada, tenho trabalhado aqui durante o dia, vou à faculdade à noite, e tenho passado madrugadas acordada, estudando, afinal não posso me descuidar logo em épocas de prova. Mariela tentava encerrar o assunto, mas as pessoas não paravam de questionar sua mudança, como se mudar fosse algo errado. Estava cansada deles e de toda a bagunça daquela cidade. Queria andar sem ser notada, sua vontade era se esconder de todos, em qualquer lugar que lhe trouxesse paz. Mas pensando bem, nada lhe traria paz, a não ser esquecer o que havia o corrido naquela noite. Na manhã seguinte era feriado, o dia acordou lindo, o sol brilhava como nunca e as nuvens deviam ter percebido que não eram bem-vindas, pois não dava para ver nenhuma delas. Os pássaros cantavam belas melodias e a brisa balançava suavemente as folas das árvores. Na praça em frente à casa de Mariela havia um banco, e da janela a jovem via que nele estava sentada uma menina de uns oito anos que se parecia muito com ela própria, quando tinha aquela idade. Começou a investigar os movimentos da criança. Ela segurava um saquinho de pipocas na mão esquerda, e com a direita escolhia primeiro as maiores para comer. A espaços curtos de tempo, jogava as pipocas menores para uns pombos que a rodeavam. Pareciam saber que ela os queria agradar. Quando seu saco se esvaziou, levantou-se e o jogou no lixo que havia não muito longe do banco. A menina observava os pássaros a sua volta, às vezes tentava pegar algum deles, mas todos se dispersavam. Mariela lembrou-se da caça aos patos, sua brincadeira favorita quando tinha aquela idade. Perecia estar revivendo os tempos no campo, era como se visse sua própria imagem projetada naquela praça. Resolveu descer e ver a menina mais de perto. Foi rápida na escadaria, por pouco não caiu. Mas segurou-se firme no corrimão, e continuou deslizando pelos degraus. Ao pisar na calçada, reparou que a garotinha havia sumido. Olhou por todos os lados, procurando aquela imagem angelical que vira de sua janela, mas não a encontrara.
Descobrindo, aos 28 anos, que ser mulher é muito mais do que sempre imaginei.
Mãe do Mateus, que me ensina tanto todos os dias sobre como ser alguém melhor e que faz o melhor que pode.